A rainha do castelo invisível

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Primeira página do livro:

 Ele teria motivos suficientes para odiar a rainha, a mulher que lhe deu a vida. Mas a seguiu feito um súdito fiel até o fim. Não que esse comportamento o transformasse num filho ideal, longe disso, até porque passou quase uma vida julgando a sua ausência. O sumiço de Helena, durante a sua infância, o acorrentou num fantasma que lhe assombrara. Quinze anos depois, num efêmero reencontro, mãe e filho seguiram caminhos distintos, deslizando suas vidas num limbo de indiferenças. Fato, é que ele não conhecia a própria mãe. Somente há três anos e meio passou a enxergá-la, quando a médica geriatra lhe revelou um transtorno mental. Estarrecido com o diagnóstico tardio, Dagnus obrigou-se a abrir as feridas da insólita relação materna à deriva de sua insipiência. Na inércia de sentimentos confusos viu-se preso em seu laço de sangue.

Agora, ele suspira o silêncio da despedida num peito consternado. Um alívio. É o único sentimento que consegue reunir enquanto ela dorme o sono eterno. Sozinho, sentado em frente ao ataúde ele olha com ternura o corpo fragilizado da mãe num vestido chique.  Símbolo da vaidade que a presenteava em vida. “Que descanse em paz” mentaliza. Enquanto espera as condolências, busca na memória uma imagem que se encaixe na família, mas é traído em pensamentos. Tudo que lhe vem, é sobre o pai. Este que faleceu na virada do século e permanece vivo em suas lembranças. Um homem de exemplos, que lhe serviu de referência por toda a vida. Não consegue compará-los. A mãe lhe escapa. Como se ela vivesse na penumbra daquela porta entre aberta da sua infância. Pensa, não ser exagero afirmar que o único elo afetivo se rompeu no cordão umbilical.

Dagoberto Nunes Roldão dos Passos, prestes a se tornar um sexagenário, prefere ser chamado de Dagnus. O apelido que o pai lhe deu na infância. Ele carrega apenas o sobrenome paterno porque Quintana e Helena nunca se casaram no cartório. Nessa solitária vigília à mãe, insiste por um legado que se sobressaia. Talvez a vaidade. Os cabelos loiros que se confundem aos fios grisalhos. Os olhos verdes ou a altura que lhe impõe certo orgulho no andar, mas não são os traços físicos que poderiam amenizar vida e morte. A distância continua latente. É nas afeições e aí, tudo se evapora, dissipando suas lembranças num tempo de autocomplacência.

No quintal da sua infância, Dagnus vivia sentado numa gangorra existencial. Ora, cavava o buraco da ausência materna e caia na solidão, tentando se agarrar na turva imagem da mãe. Ora, era uma criança alegre entre amigos a brincar enquanto o sol permitisse. De todas as aventuras, só se destacou no carrinho de rolimã: descia uma das primeiras ruas centrais com asfalto feito um piloto de Fórmula Um e ao ganhar a esquina fazia manobras radicais. Era destemido num jeito esquisito de ser. Caçar passarinho, não tinha uma boa mira com os bodoques, as suas pipas não saiam do chão e no futebol, só jogava se fosse goleiro. Ainda assim, isso amenizava aquela ferida até a hora de voltar para casa no fim de tarde.

O pai, pouco percebia por se ocupar em efêmeras aventuras tentando espantar uma tristeza crônica. Era na música que eles se aproximavam, tanto que a melodia 

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